Créditos: imagem gerada por IA
Você acordou nesta terça-feira e percebeu que algo estava diferente? O silêncio dos eletrodomésticos, a internet fora do ar, o semáforo apagado. Se sim, você não estava sozinho. Nas primeiras horas da manhã de hoje (14/10/25), um evento de grande porte no sistema elétrico, originado por uma falha no Paraná, mergulhou boa parte do Brasil em um apagão, com reflexos sentidos de norte a sul, inclusive aqui no nosso Piauí.
Mas o que, afinal, acontece para que um incidente a milhares de quilômetros de distância apague as luzes em Teresina ou Parnaíba? A resposta está na complexa e fascinante teia que forma nosso sistema elétrico nacional.
Para entender o ocorrido, pense no Sistema Interligado Nacional (SIN) como o sistema circulatório do Brasil. As usinas hidrelétricas, solares e eólicas são os corações, bombeando energia. As linhas de transmissão são as grandes artérias e veias, transportando essa energia por todo o território. Quando uma falha grave acontece, como a queima de um transformador de alta capacidade em uma subestação no Paraná, é como se uma artéria principal fosse subitamente bloqueada. O sistema, para não entrar em colapso total – o equivalente a uma parada cardíaca sistêmica –, possui mecanismos de defesa inteligentes que agem em milissegundos.
Esses mecanismos, chamados Esquemas Regionais de Alívio de Carga (ERAC), funcionam como disjuntores de emergência em escala continental. Ao detectar uma perda súbita e massiva de geração ou transmissão, como a reportada hoje pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que indicou uma perda de mais de 16 mil megawatts, o sistema automaticamente "desliga" algumas regiões para manter o equilíbrio e evitar danos piores e mais duradouros.
É um sacrifício calculado: interromper o fornecimento para milhões de pessoas por algumas horas para impedir um blecaute generalizado que poderia levar dias para ser resolvido. Por isso, mesmo o Piauí sendo um gigante na geração de energia solar e eólica, ele também foi afetado, pois está conectado a essa mesma "corrente sanguínea" nacional.
Eventos como este expõem os desafios inerentes a um sistema tão vasto e interdependente. Um dos principais é a necessidade contínua de modernização da nossa infraestrutura de transmissão, que em alguns pontos já sente o peso dos anos. Além disso, a transição energética, com a crescente participação de fontes intermitentes como a solar e a eólica, exige uma rede mais flexível e inteligente. A energia gerada nos parques do Piauí precisa viajar por essa "malha arterial" para chegar aos grandes centros consumidores do Sudeste. Qualquer instabilidade no caminho representa um risco para todos.
A solução para essa vulnerabilidade não está em isolar as regiões, mas em fortalecer as conexões com tecnologia e planejamento. Isso significa investir maciçamente na modernização das linhas de transmissão, na digitalização da rede para criar "smart grids" (redes inteligentes) que preveem e se adaptam a falhas, e, fundamentalmente, em sistemas de armazenamento de energia, como grandes baterias.
Essas tecnologias permitiriam guardar a energia solar gerada em excesso durante o dia no Piauí para ser injetada na rede durante a noite ou em momentos de crise, aumentando a estabilidade e a segurança de todo o sistema.
O apagão desta terça-feira, portanto, mais do que um transtorno, é um importante lembrete. Ele nos mostra a genialidade de ter um sistema interligado, capaz de levar energia limpa do Nordeste para o Sul, mas também evidencia suas fragilidades. O futuro da energia no Brasil depende da nossa capacidade de tornar essa rede não apenas maior e mais verde, mas também mais robusta, resiliente e inteligente. O Piauí já faz sua parte na geração; agora, o desafio nacional é garantir que essa energia flua de forma segura e ininterrupta para todos os brasileiros.