A megaoperação policial realizada no Rio de Janeiro nesta terça-feira (28), que já deixou ao menos 119 mortos, foi classificada pelo governador Cláudio Castro como um sucesso. Mas, para especialistas, o episódio representa a ação mais letal da história das forças de segurança no país, superando o massacre do Carandiru, em 1992, e evidencia a falência de uma política de segurança baseada no confronto.
Em entrevista à TV Cidade Verde, o sociólogo Marcondes Brito, coordenador da Rede de Observatórios de Segurança Pública no Piauí, avaliou que o caso deve gerar reflexos em todo o Brasil, inclusive no Nordeste, por causa da atuação transnacional das facções criminosas.
“Essas facções já são transestaduais e transnacionais. Uma ação como essa pode reverberar na maneira como esses grupos atuam em outros estados”, destacou Brito.
Segundo ele, o número de mortos e a forma de atuação da polícia no Rio de Janeiro contrariam protocolos nacionais e internacionais de policiamento, que preveem evitar o confronto quando há risco de atingir civis. “Somando o Complexo do Alemão, o da Penha e comunidades vizinhas, mais de 350 mil pessoas ficaram sem aula, sem trabalhar, sem poder circular. Isso mostra uma estrutura de segurança extremamente reativa”, pontuou.
O sociólogo afirmou que países que enfrentaram o narcotráfico com intervenção militar, como Colômbia e México, não conseguiram reduzir o poder das organizações criminosas. “O narcotráfico cresceu nesses períodos. Esses países só começaram a resolver seus problemas quando entenderam que segurança é política integrada, com assistência, saúde e educação”, explicou.
Brito também defendeu o uso da inteligência policial, investigação e interceptações telefônicas como alternativas mais eficazes e menos letais.
“A função básica da polícia é prender, não matar. Quanto mais recorre à violência, mais o outro lado acirra a violência também. Não se combate crime com crime, mas com Justiça atuante e polícia calcada na preservação da vida”, afirmou.
O especialista alertou ainda para o avanço das facções no Nordeste, citando o caso do Comando Vermelho, que já estaria em uma “quarta fase”, de infiltração política.
“O Comando Vermelho já está financiando campanhas em várias cidades do Ceará. O Ministério Público cearense, inclusive, pediu a cassação de prefeitos por envolvimento direto com organizações criminosas oriundas do Sul e Sudeste”, revelou.
Para Marcondes Brito, o episódio no Rio de Janeiro deve servir de alerta para os estados, inclusive o Piauí, sobre os riscos de políticas de segurança centradas no confronto.
“O Rio está mostrando da pior forma possível o que acontece quando a política de segurança não se baseia em inteligência e integração”, concluiu.